2008/01/31

Yeasayer

Suor

Há uma paisagem nestas notas, é seca, quente e repleta de vastos campos de areia, à primeira vista poderá parecer um deserto, mas não, o que aconteceu foi que a metrópole levantou voo e aterrou algures no Norte de África poeirento. O constante equilíbrio entre o urbano e o tribal dá-lhe um toque de calor, um constante movimento de corpos suados, misturam-se com especiarias e fumos estranhos.
Os Yeasayer são uma banda de Brooklyn, dificilmente poderiam ser mais citadinos, esse habitat irá dar-lhes a criatividade suficiente, para produzirem um som arrojado, mas perfeitamente controlado, a divisão de sonoridades cola-os a uns Animal Collective ou mesmo aos Grizzly Bear, se bem que o resultado é um world-indie-pop.
Usam uma forma enigmática, mas bastante sofisticada de compor cada um dos seus temas, existe uma completa liberdade de criação, não estão a presos a normas ou regras. “Sunrise” é gospel do Grande Atlas; “2080” é pop de uma qualquer tribo centro africana; “Germs” é uma reunião de coros após um dia de trabalho.
All Hours Cymbals é um excelente trabalho de apresentação destes Yeasayer, banda que assume a sua posição dúbia, poderiam ser catalogados como world music, mas mim parece-me mais uma world band.

Momento Mágico: No Need To Worry


Yeasayer All Hour Cymbals (2007) - Now We Are Free

2008/01/28

Vietnam

Revivalismo

Vietnam é um nome estranho para uma banda e se por mero acaso a banda for nova-iorquina, o estranho eleva-se ao cubo, seja como for o importante é a música e é nela que me vou concentrar. Psychadelic rock dos anos 70’s, onde abundam e abusam as guitarras e os riffs, somam-se isto a voz de Joshua Grubb, que se aproxima imensas vezes do timbre de Bob Dylan, o resultado final são uns Black Crowes não tão obscuros.
O revivalismo hippie está presente a cada nota, a forma como tudo é edificado segue os rigorosos padrões de uma época, usam as formas de uns Led Zeppeplin quando querem mostrar trabalho de puro rock e os trejeitos de uns Velvet Underground quando querem demonstrar o seu lado mais arty.
Os Vietnam não tem qualquer intenção de disfarçar a sua veia de puros rockers, não estão preocupados com rótulos ou etiquetas, a música está quase toda inventada, o que por aqui se passa não trás nada de novo, limitam-se a baralhar as cartas e dar um novo jogo, enquanto escorre mais um gole de Bourbon.

Momento Mágico: Welcome To My Room


Vietnam
Vietnam (2007) Kemado

2008/01/25

Le Loup

Pseudo-Folk

A constante presença do som do banjo, poderia dar aos Le Loup uma roupagem exclusivamente country, mas toda a parafernália musical que circula à sua volta transforma som da banda num perfeito indie-folk. Poder-se-á acusar a banda de Washington DC nascida em 2006, de viver um pouco prisioneira do universo criado pelos Grizzly Bear e Arcade Fire, que nos dias que correm é mais uma constatação que uma acusação, mas penso que os Le Loup souberam aproveitar algumas das características de ambas e criarem um universo paralelo, muito mais ao estilo de uns Notwist ou de uns 13 & God.
Ao primeiro álbum The Throne of the Third Heaven of the Nations' Millennium General Assembly, os Le Loup usam folk experimental e electrónica q.b. aproveitando para continuar a extrair desse filão mais umas quantas pepitas de ouro, que depois de trabalhado irá ser transformado em pequenos belos lingotes.
Se há uns anos isto seria weird-folk, agora é quase passível de ser pop corriqueira, o que demonstra que para além da existência de uma linha de conduta que está a ser seguida por um sem numero de bandas das mais diversas correntes artísticas, há também um certo nível de inteligência que hoje marca as novas tendências musicais, não querendo ficar prisioneiras deste ou daquele género musical.
Todo álbum é rico em pequenos pormenores, desde do canto de pássaros “Canto I”, aos sons da mãe natureza “(Storm)”, a constantes jogos de harmonias vocais em “Le Loup (Not Fear)”. Mas o disco não vive só de pormenores, com “Planes Like Vultures”, “Look To The West” e “Outside Of This Car, The End Of The World!”, já há verdadeiras marcas de fogo, provando que os Le Loup são uma banda cerebral, usando com imenso cuidado e cautela tudo o que lhes tem chegado aos ouvidos. Excelente primeiro disco, banda a seguir com atenção.

Momento Mágico: We Are Gods! We Are Wolfes!


Le Loup - The Throne of the Third Heaven of the Nations' Millennium General Assembly (2007) – Hardly Art

2008/01/21

Radiohead

Ás Cores

Ao 9º álbum, os Radiohead regressam ao formato puramente pop/rock, assinando 10 temas inundados de beleza e sentimentos. In Rainbows é a amálgama de uma carreira, que já dura há duas dezenas de anos e ouvindo o disco em loop, fica a ideia que já não há nada a provar, os Radiohead fazem o que bem lhes apetecer. Não há normas, regras ou formatos, é tudo construído com paixão e dedicação minuciosa, existe uma atenção cuidadosa a todos os sons e a todos os ruídos, tudo é importante, tudo conta, tudo ilumina…
A subtileza criativa procura novos esquemas e novos espaços e o que para muitos é um caminho feito a medo, para eles é uma suave passagem, um lugar pacífico e é dessa forma que conseguem transições perfeitas, transposições temáticas e sonoras de uma eficácia atroz.
In Rainbows irá marcar também toda a música e respectiva indústria, a distribuição gratuita (ou remunerada à vontade de cada um) é o ponto de fractura, no futuro haver uma clivagem naquilo que em tempos foi um grande negócio. A partir de agora haverá um antes e um após In Rainbows. Com este passo de magia, os Radiohead deram o golpe final, na já moribunda indústria da música e transformaram uma relação que era altamente promíscua, numa bonita relação a dois (eles e nós).
Afinal fábula é mesmo verdadeira, no fim do arco-íris há um grande e enorme pote de ouro.

Momento Mágico: House Of Cards


RadioheadIn Rainbows (2007)

2008/01/19

The Mars Volta

De Volta

Dêem pulos de alegria aqueles que acham que o De-loused in the Comatorium é o melhor ou até o único álbum que gostam dos Mars Volta.
Os vídeos que eles disponibilizaram na internet faziam antever que o som voltasse às origens. Aquela energia que tanto os caracterizou está bem patente neste registo onde os experimentalismos ficaram de lado, ou são pelo menos mais discretos.
A dupla Cedric e Omar foi sempre muito forte em palco, com muitos malabarismos e sentimento no que estão a tocar, e penso que este álbum tem músicas que vão funcionar muito bem ao vivo.
Os Mars Volta estão de volta.

Momento Mágico: Goliath


The Mars Volta - The Bedlam In Goliath (2008) - Universal

2008/01/16

Ian Brown

Animal Politico

Passados que foram mais de 10 anos sobre o fim dos Stone Roses, a aventura pop continua. Nos finais dos anos 80, Ian Brown e mais uns amigos criam em Manchester a obra prima homonima The Stone Roses. E é com essa obra que se dá a explosão musical, que se veio designar por Madchester, movimento caracterizado pela fusão do indie-rock com a dance-music, onde para além dos já referidos Stone Roses, habitavam ainda os Happy Mondays, 808 State, James, entre muitos outros.
Mais velho e não tão expressivo como no passado, Ian Brown produz obras mais sossegadas, albuns mais reflectidos, o resultado tem sido uma carreira em camara lenta, sem grandes sobressaltos. The World Is Yours carrega tudo isso às costas, é introspectivo, é pensado, continua a manter a veia revolcionária de Brown, que desta forma continua a destilar e a descarregar sobre os mais diversos cenários politicos e sociais do presente.
O novo trabalho abre com “The World Is Yours” uma demostração de carácter e afirmação, orquestrado q.b., bem ao estilo de uns The Verve. Com “Eternal Flame” Ian Brown assina um tema cheio de estilo, compassado e relaxado. Em “The Feeding Of The 5000” Ian Brown leva ao extremo o seu método construtivo, apesar de imensamente simples, constanta-se que existe muito trabalho de laboratório. No dueto de Brown com Sinead O’Connor em “Illegal Attacks” é mostrado toda a sua vertente politica, relatando em forma de musica o problema Israelo-Arabe e respectivas explosões colaterais.
Ian Brown não morreu, está vivo e bem vivo, há que o continuar a escutar com atenção.

Momento Mágico: Illegal Attacks


Ian Brown
– The World Is Your (2007) - Universal/Polydor

2008/01/13

José González

Viagem Lo-Fi

José González saltou para a ribalta graças à inclusão do tema Heartbeats, presente no seu álbum de estreia Veneer, numa campanha comercial de um determinado tipo de televisores. Foi grande o hype gerado à sua volta, rapidamente alguns dos seus temas foram incluídos em séries de televisão (The O.C., Scrubs, One Tree Hill, etc) e todo este processo culminou com o convite feito pela dupla Henry Binns/Sam Hardaker (Zero 7) para que desse o seu contributo musical para o álbum The Garden editado em 2006.
2007 marca o regresso de José González com a edição do disco In Our Nature e para surpresa de muitos, que aguardavam uma alteração drástica no seu som, a prossecução da fórmula iniciada em Veneer. Aprofundando o estilo lo-fi, José González continua a confiar na sua guitarra, num bater de pés ocasional, num suspiro vigoroso (no final do tema In Our Nature) ou em algumas palmas fugazes, para nos transmitir “os aspectos mais primitivos do ser humano” (como o próprio fez questão de afirmar acerca da edição deste disco).
In Our Nature é uma viagem introspectiva, mais negro, explora os recantos mais sombrios da natureza humana com um tom magoado, basta ouvir o primeiro verso do tema de abertura “How Low” (“How low are you willing to go before you reach all your selfish goals?”) para se sentir um arrepio na pele.
“Down The Line”, “In Our Nature”, “Time To Send Someone Away”, “Cycling Trivialities” progridem nesse caminho reflectivo e constituem o núcleo duro deste disco onde o lo-fi, o pop, o rock, a bossa nova e o folk são as ferramentas eleitas por este “artesão” um dos poucos defensores da simplicidade do binómio voz/guitarra num mundo cada vez mais digital.

Momento Mágico: Cycling Trivialities


José González
- In Our Nature (2007) - Peacefrog

2008/01/09

Black Mountain

Renascer

Stephen McBean é um mestre fora do seu tempo, a forma como o domina a estrutura mais crua do rock, a maneira como desenha a sua vertente mais psicadélica, catapulta-o para um patamar onde vivem nomes eternos como os Love, os Velvet Underground, Led Zeppelin ou até uns Spacemen 3. Existe nele uma capacidade intrínseca, para criar temas carregados de sombras e fantasmas, todos eles habitando o lado mais negro da sua alma. Esta referencia exclusiva a McBean, é propositada, sem ele não existiam os Black Mountain, nem Pink Mountainstops, nem Jerk With A Bomb, ele é o corpo e alma destes projectos, não há como nega-lo.
Após o disco de 2005, os Black Mountain delimitaram o seu espaço, dando a actual cultura indie-rock, a possibilidade de poder caminhar por locais que se pensavam estar esgotados ou sem vida. Se no primeiro disco tinha ficado algo por dizer, com In The Future a odisseia continua cheia de vivacidade e energia, se bem que agora se percorrem águas mais calmas.
A abertura de In The Future é feita com “Stormy High” prog-rock em alto galope, “Angels” é uma calmaria generalizada, o mundo onde vivem os anjos. “Tyrants” começa com um intensidade brutal, um riff construído com enorme sabedoria, para à posterior desaguar numa luta de vozes, onde a presença da voz de Amber Webber (Lightning Dust) é a cereja em cima do bolo. “Queens Will Play” tem o formato tradicional de canção, perfeita no forma como cresce e intensa ao morrer. “Brigth Lights” é monumental, é um hino de quase 17 minutos onde vale tudo, onde todas as regras estão presentes, não existem fronteiras, o céu é o limite.
Os Black Mountain abriram o portal dos 70’s, os Black Mountain viajaram na máquina do tempo e produziram um disco enigmático e atmosférico, onde criaturas de pensamentos mais puros não tem lugar e onde renascer é sinónimo de nascer noutro tempo.

Momento Mágico: Tyrants


Black MountainIn The Future (2008) – Jagjaguwar