2008/06/26

The Accidental

Verdes Campos

O folk imanado pelos The Accidental, tem contornos rurais, cheira a riachos e a fardos de palha, esboça um universo perfeitamente campestre, tudo é sossegado, tudo é pacifico. “Knock Knock” dá o pontapé de saída de There Were Wolves e surge como um convite ao mundo de The Accidental. Tudo parece surgir do nada, um leve bater à nossa porta, ao qual sem medo respondemos, abrindo a porta deixamos entrar uma corrente de fresco folk, que de imediato se espalha e inunda toda a casa dando-lhe uma luminosidade primaveril e um fabuloso e intenso cheiro a flores. Ouça-se por exemplo “I Can Hear Your Voice” que surge como um passeio a dois, através de uma curta estrada de terra batida, numa abafada tarde de calor.
Durante todo o sistema de estruturação musical, os ingleses The Accidental que nascem da união de 4 pessoas, na qual se destacam Stephen Cracknell (The Memory Band) e Sam Genders (Tunng), vão usando regras e normas repletas de antecendentes musicais. Saltam à vista e chegam-nos aos ouvidos nomes com Iron & Wine, Espers ou White Magic, a norma folk de perfis perfeitos, sem mácula, sem desvios, está tudo lá, vozes sobrepostas, acordes sobranceiros, percussões em complemento.
There Were Wolves
é um disco de imagens, está inundado de paisagens, de pequenos tiques e cliques. Há como uma intenção de normalidade, tudo caminha para o sossego perfeito, todos os rios desaguam no mar, o dia nascerá outra vez amanhã, eu respiro, tu respiras… esmerado, porque é simples.

Momento Mágico
: Illuminated Red


The Accidental
There Were Wolves (2008) - Thrill Jockey


2008/06/22

Fuck Buttons

Circular

A propagação sonora dos primeiros minutos de “Sweet Love For Planet Earth” (o primeiro tema do primeiro álbum de Fuck Buttons) é fortemente psicótico, aliás chega a ser quase psiquiátrico, surgem milhares de drones por todo lado e querem ficar a viver à força no recanto mais escuro do nosso cérebro. É uma pura rajada cósmica que durante 9 minutos, nos amotina o estômago, nos massacra toda a estrutura óssea. É uma imaculada implosão de sensações, uma demonstração cabal que é possível estoirar, com tudo o que está previamente convencionado. “Ribs Out” alimenta a esperança em conseguir sair deste inferno, em que se tem transformado o mundo á nossa volta. É genuíno grito tribal a combinar com a réstia de fé, que ainda vai sobrando em cada um de nós, uma espécie de angélicos missionários em desespero de causa. O episódio seguinte “Okay, Let's Talk About Magic”, adensa ainda mais a parte negra do universo dos Fuck Buttons, é um puro buraco negro, atrai toda a massa á sua volta, nada sobra, toda a luz é por ele absorvida, o que está para lá ainda ninguém sabe. A confiança retorna às primeira batidas de “Bright Tomorrow”, vagueia-se meio caminho para depois e após uma intensa batalha de ruídos, se retornar ao ponto de partida.
Se no inicio do disco se destrói toda a estrutura, com os loops de “Colours Move” chegamos à alma, ao espírito da coisa, só que infelizmente (ou talvez não) a esta altura, todos os sectores deixaram de estar ligados entre si, pouco ou quase nada sobrou, resta apenas uma pequena e suave névoa no horizonte, no ar ficou apenas a pairar a ideia, de que logo que tudo o pó desapareça, ser possível voltar a edificar tudo novamente.
Brits Andrew Hung e Benjamin John Power, assinam um potentíssimo disco de estreia, não é um disco dócil, não é um disco fácil, não é um disco para todos, é preciso abraçá-lo, é preciso compreende-lo. O fundamental é ouvi-lo com imensa atenção, o importante é dar-lhe espaço, o que é realmente necessário, é quebrar barreiras mentais e sonoras.

Momento Mágico: Sweet Love For Planet Earth


Fuck ButtonsStreet Horrrsing (2008) - ATP Recordings

2008/06/18

American Music Club

Dourado

Não sei o que irá acontecer até ao fim de 2008, mas os American Music Club ao apresentarem o seu novo disco The Golden Age, assinam um dos melhores discos do ano. Mark Eitzel e companhia, continuam o seu percurso, uma suave caminhada dentro slowcore de contornos folk, onde o lirismo é uma arma e a orla musical é o perfeito fio condutor.
Ao desembrulhar The Golden Age, a primeira luz que brilha é “All My Love” um arrastado tema de amor, carregado de ténue esperança e forte delicadeza. “The Victory Choir” é pop talentosa, sem qualquer tipo de grandeza, apenas mostrar que é tão fácil ser simultaneamente simples e fascinante. “The Sleeping Beauty” é percorrer luminosas planícies, é estar acordado e sonhar profundamente, é a busca do beleza interna.
Produzido por Dave Trumfio (Wilco/My Morning Jacket) que fazendo uso de toda a sua experiencia e técnica, foi levantando a obra de uma forma subtil e suave, dando corpo a uma colecção de temas, onde nostalgia, melancolia e desgosto, vão casando na perfeição com as guitarras acústicas, com as harmonias requintadas, com a voz melosa e pastosa de Eitzel.
Os American Music Club vão aparecendo e desaparecendo de cena, gostam de estar e de não estar, o universo musical e todo o star-sistem não é o seu mundo, mas penso que é este permanente ligar e desligar, que faz deles uma estupenda banda.

Momento Mágico
: One Step Ahead


American Music Club
The Golden Age (2008) - Merge Records

2008/06/14

Resposta Simples

Puro e Duro

O formato já há muito que foi criado, a dificuldade está em conseguir inovar, para isso será necessário agarrar no mesmo barro e ir pouco a pouco desenhado o objecto pretendido. Foi a isso que se propuseram 3 amigos, que munidos de imensa força de vontade, formaram os Resposta Simples. O power-trio açoreano já com 5 anos de existência, lida com enorme à vontade quer com toda a construção musical, quer com todo o sector vocal. É assim que vão edificando um universo penetrante e incisivo, o resultado são torrentes de energia, rasgos de potencia e toneladas de raiva em formato hard-core.
Sonho Peregrino é o álbum de estreia dos Resposta Simples, 9 temas de puro e duro hardcore cantado em português, coisa que é pouco habitual nestas andanças, aliás o mais normal é esconderem-se por detrás da língua inglesa e assim tentarem passar despercebidos, muitas vezes ocultando a mensagem. Ora os Resposta Simples não o fizeram, criaram uma banda com nome português, editaram um disco com titulo em português, escreveram e cantaram canções em português, podem não ser o pioneiros, mas são certamente dos poucos a fazê-lo.
Tema após tema Sonho Peregrino vai debitando cargas de decibéis, ao mesmo tempo que vão transmitindo ideias e ideais. “Meias conversas para mim não servem… Quem quiser mudar tem de uma atitude tomar…” ouve-se em “Atitude (começar de novo)” ou “Como podes criticar se estás sempre a falhar?” em “Descanso Eterno”, são exemplos que há contexto para lá das notas musicais.
Há muitos anos que uso uma máxima, o problema nunca é dos discos, nem das bandas, a existir alguma dificuldade ela está sempre nos nossos limites, nas nossas fronteiras musicais, nos nossos ouvidos… por isso, deixem de ser duros de ouvido, Sonho Peregrino é isso tudo, não é um disco para meninos, é um disco para rapazes/homens de barba rija.
Para ouvir e encomendar:
http://www.myspace.com/respostasimples
http://www.impulsoatlantico.com/

Momento Mágico
: Genocídio Cultural


Resposta SimplesSonho Peregrino (2008) – Impulso Atlântico

2008/06/10

Animal Collective

4 Músicos, 4 Temas

A paranóia colectiva, a destruição de tabus, o constrói-destroi dos Animal Collective é uma delicia. É óptimo quando uma banda rompe o star-sistem e faz o que lhe vai na alma, não ligando patavina às regras, às normas vigentes. Fazem assim porque gostam, fazem assim por são assim. O EP Water Curses é isto tudo, é Animal Collective na sua perfeição, continuam o seu passeio imunes a tudo e a todos, delineiam um caminho e com passos exactos pintam numa tela todas as cores disponíveis e é nela que estampam a sua pop psicótica, encharcada de micro sons e constantes revoluções sonoras.
Este EP é a forma ideal para conhecer, o que é, quem são, os Animal Collective. Ao longo de 4 temas expõem toda a sua potencialidade e todo seu (mau) génio. 4 músicos, 4 temas, não sei se foi intencional, mas consigo separar 4 perfeitos universos neste Water Curses, como se cada tema fosse a face de cada um dos seus elementos, assim sendo temos:
Water Curses” com toda a personalidade de Avey Tare (David Portner); “Street Flash” é puro Panda Bear (Noah Lennox) coros intensos e torrentes de ecos; “Cobwebs” mostra a minúcia de Geologist (Brian Weitz) ao comando de todos os botões e parafernálias electrónicas; por fim “Seal Eyeing” mostra Deakin (Josh Dibb) talvez a parte mas serena, a zona mais tranquila de Animal Collective.
O EP Water Curses mostra que tudo vai no bom caminho, que índole paranóica da musica dos Animal Collective continua em forma, que tudo persiste, que tudo segue a rota anteriormente projectada.

Momento Mágico: Street Flash


Animal CollectiveWater Curses [EP] (2008) - Paradise Recordings

2008/06/05

Bon Iver

Sofrido

Bon Iver é um sofredor, mas sofre com prazer, é uma alma solitária com corpo físico e é com o espírito destroçado que desenha For Emma, Forever Ago. Justin Vernon aka Bon Iver constrói temas musicais recorrendo a dois simples factores, musicalmente agarra-se ao folk-acustico, enquanto em relação às palavras agarra-se à poesia ou seja estamos perante o perfeito songwriter. Bon Iver com esta perfeita voz em falseto, com esta guitarra sempre em permanente penar e rodeado por este clima sombrio e nebuloso, vai narrando histórias de amor não correspondido, paixões impossíveis, separações dolorosas, onde pouco espaço há para a alegria e para os dias claros.
For Emma, Forever Ago inicia o seu árduo caminho com “Flume” uma longa caminhada por dias amargurados, onde há muito o sol já não habita, o tempo ficou imóvel naquele preciso momento em que o dia termina e a noite ainda não acordou. “The Wolves“ é um místico coral gospel, submergido por vozes em ruína, onde o isolamento é uma imagem perfeita, a solidão só pode fazer bem. A entrada de “For Emma” faz-se ao som de uma guitarra transversal, antevendo uma música com algum sol, mas logo se transforma novamente num dia carregado de nuvens cinzentas. Bon Iver pode-se arrumar na mesma prateleira, onde vivem nomes como Iron & Wine, Elvis Perkins ou Sparklehorse, dividem todos o mesmo intenso aroma da América profunda, daquele país que raramente é divulgado nos folhetos turísticos.
For Emma, Forever Ago é profundo e sentido, consegue ser ao mesmo tempo negro, mas também ser intensamente luminoso.

Momento Mágico: Creature Fear


Bon Iver
For Emma, Forever Ago (2008) - Jagjaguwar